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Tudo começa com oração: O fundamento da vida beneditina

E se toda ação do seu dia começasse com uma recordação de Deus?

No versículo 4 do Prólogo, São Bento estabelece um princípio fundamental: “Antes de tudo, quando encetares algo de bom, pede-lhe com oração muito insistente que seja por ele plenamente realizado.”

Antes de tudo. Não depois, não durante, não eventualmente. Antes. A oração não é um complemento da vida — é seu fundamento. Não é o telhado da casa espiritual — é o alicerce.

A oração como ponto de partida

Para São Bento, nenhuma boa obra deve começar sem oração. Isso vale para as grandes decisões e para as pequenas tarefas. Vale para o trabalho e para o descanso. Vale para a leitura e para a conversa.

Há uma observação bem-humorada que aparece na tradição beneditina: mesmo que um grupo se reunisse para tramar algo errado, se começasse com oração, pelo menos ficaria constrangido. A oração tem esse poder de iluminar, de revelar, de colocar tudo sob o olhar de Deus.

Quando começamos algo com oração, estamos reconhecendo que não somos autossuficientes. Que precisamos da ajuda de Deus. Que o resultado não depende apenas de nosso esforço, mas da graça divina.

E estamos também direcionando nossa intenção. A oração inicial pergunta: para quê estou fazendo isso? Para minha glória ou para a glória de Deus? Para meu proveito ou para o bem dos outros?

A definição de Evágrio Pôntico

Evágrio Pôntico foi um monge do século IV, discípulo dos grandes Padres do Deserto, que deixou uma definição clássica de oração: “Oração é a elevação da mente a Deus.”

Essa definição, na sua simplicidade, é revolucionária. Oração não é necessariamente palavras — é elevação. Não é necessariamente tempo reservado — é direção da mente. Não é necessariamente lugar sagrado — é qualquer lugar onde a mente se eleva a Deus.

Isso significa que é possível orar sempre, em qualquer circunstância. São Paulo pede: “Orai sem cessar” (1 Tessalonicenses 5,17). Como isso é possível? Não por estar sempre de joelhos ou sempre recitando fórmulas, mas por manter a mente voltada para Deus, por fazer tudo na presença dele, por elevar o coração a ele em meio às atividades.

Ora et Labora: a oração que permeia o trabalho

O lema mais conhecido da tradição beneditina é Ora et Labora — “Ora e Trabalha”. Mas esse lema não significa “às vezes ora, às vezes trabalha”, como se fossem atividades separadas. Significa que oração e trabalho se interpenetram, se iluminam mutuamente, se tornam uma coisa só.

O monge não para de orar quando começa a trabalhar. Ele trabalha orando. A tarefa manual se torna oração quando é feita na presença de Deus, com intenção reta, oferecida a ele.

E a oração não é fuga do trabalho. Não é alienação das responsabilidades terrenas. A oração beneditina é encarnada, concreta, inserida no ritmo do dia. Os ofícios da Liturgia das Horas marcam o tempo, santificam as horas, mas entre um ofício e outro há trabalho, estudo, serviço.

A oração como atmosfera da vida

Mais do que momentos específicos, a oração beneditina é uma atmosfera. É um clima que envolve toda a vida. É a consciência permanente da presença de Deus.

O capítulo 19 da Regra diz: “Cremos estar em toda parte a presença divina e que os olhos do Senhor veem em todo lugar os bons e os maus.” Se Deus está presente em toda parte, então toda parte é lugar de oração. Toda atividade pode ser oração.

Isso não significa que os momentos específicos de oração sejam dispensáveis. Pelo contrário, são eles que alimentam a atmosfera. A Liturgia das Horas, a lectio divina, a oração pessoal — esses momentos fortes de oração são como as refeições que sustentam o corpo ao longo do dia.

Como cultivar a oração no cotidiano

A vida moderna não permite que a maioria das pessoas siga o ritmo de um mosteiro, com sete ofícios litúrgicos ao longo do dia. Mas os princípios beneditinos podem ser adaptados:

Comece o dia com uma breve oração. Antes de olhar o celular, antes de verificar as notícias, eleve a mente a Deus. Um Pai-Nosso, uma Ave-Maria, uma simples oferta do dia.

Antes de cada tarefa importante, faça uma pausa de um segundo. Respire. Lembre-se de que Deus está presente. Peça sua ajuda.

No meio do dia, faça uma parada breve. Pode ser na hora do almoço, pode ser no meio da tarde. Alguns minutos de silêncio, de leitura espiritual, de exame de consciência.

Termine o dia com gratidão. Antes de dormir, reveja o dia. Agradeça o que foi bom. Peça perdão pelo que foi mal. Entregue a noite a Deus.

Pede com oração

“Antes de tudo, pede-lhe com oração.” Essa instrução de São Bento não é apenas para monges — é para todo cristão que quer viver sua fé de forma integrada.

A oração não é um departamento separado da vida. É o fundamento que sustenta tudo. É a luz que ilumina tudo. É o ar que permeia tudo.

Começar com oração é reconhecer que não estamos sozinhos, que não somos autossuficientes, que há Alguém maior conduzindo nossa história. E esse reconhecimento muda tudo.

Escrito por Um Servo da Tenda

Grupo de Oração Tenda do Senhor

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