Visto que Jesus era verdadeiro Deus e verdadeiro homem, pergunta-se: Jesus, como homem ou em sua consciência psicológica, sabia que era Deus? Sabia que a sua natureza humana estava unida à divina e subsistia pela Segunda Pessoa da Santíssima Trindade? A resposta para essas perguntas não é fácil, mas a mais plausível é: Jesus tinha uma só pessoa que era a divina, ou a pessoa do Filho de Deus.
Encarnando-se, essa pessoa nada perdeu do que era e possuía eternamente; por conseguinte, mesmo peregrino na terra, o eu de Jesus conhecia tudo o que Deus conhece: o mistério da Santíssima Trindade, com sua riqueza de atributos, e todas as coisas. Além da sua natureza divina, Jesus tinha uma natureza humana. Esta, embora não tivesse um eu humano próprio, mas vivesse o eu do Filho, tinha uma consciência psicológica, isto é, a faculdade de conhecer a si mesmo (como todos nós temos).
Assim, Jesus sabia que era verdadeiro homem e vivia como verdadeiro homem; sabia que subsistia pela subsistência da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. Não podia crer que tinha uma pessoa humana. Contudo, na consciência de Jesus, o divino tinha supremacia; o principal traço dessa consciência era saber-se Filho de Deus.
A Ciência de Jesus
Como se pode conceber a ciência que Jesus tinha do plano do Pai, da sua missão e das criaturas? Fixaremos nossa resposta no seguinte:
1. Jesus, como homem, possuía as faculdades de conhecimento (intelecto, sentidos) comuns a todos os homens. Por isto pode o Evangelho dizer que Ele crescia em sabedoria (cf. Lc 2, 52).
2. Porém, Jesus como homem, devia conhecer o desígnio do Pai e o desfecho da sua missão, pois Ele precisava proclamar a sua mensagem com segurança. Esse conhecimento era-lhe comunicado por ciência infusa, ciência não adquirida pelo estudo ou pela experiência, mas por comunicação direta de Deus.
A Graça em Cristo
Graça é dom. Ora, certamente, a humanidade de Cristo foi enriquecida com muitos dons, dos quais sejam alguns postos em relevo:
1. A Graça da União: na união hipostática, Deus se deu a Jesus não mediante um dom criado, mas imediatamente de Si e de modo irreversível. Jesus possuía uma santidade substancial, ao passo que a nossa é acidental. Jesus é propriamente Filho de Deus por viver da pessoa do Filho de Deus; nós, ao contrário, somos filhos adotivos;
2. A Graça Habitual ou Santificante: é um dom que nos faz filhos de Deus, habilitados a participar da vida do próprio Deus; recebemo-lo no Batismo. Jesus possuía todos os dons e graças que os homens deveriam receber para a sua santificação, pois é a Cabeça e a Fonte de cuja plenitude recebemos graça por graça.
A Liberdade de Cristo
Liberdade de arbítrio é a faculdade de nos orientarmos para o nosso fim supremo (ou para a nossa plena realização) de maneira espontânea e não constrangida ou violenta. Assim, a liberdade é um meio e não um fim. Ela nos possibilita praticar o que Deus quer de modo responsável, por decisão espontânea e sem coação interna. Liberdade de arbítrio não é arbitrariedade, nem necessariamente possibilidade de pecar.
Ora, Jesus, como verdadeiro homem, foi livre e usou da sua liberdade para se entregar generosamente à vontade do Pai. Ele sentiu a dor que tal atitude podia causar à natureza humana, por isso estremeceu e suou sangue diante da perspectiva da sua Paixão; chegou a pedir que o Pai o isentasse do cálice, mas superou o horror natural pedindo que se fizesse a vontade do Pai e não a dEle (cf. Lc 22, 41ss). Foi por espontânea vontade que Jesus assumiu a sua morte no tempo e no lugar previstos pelo Pai. Desta forma, Jesus fez da sua condenação uma oferenda voluntária.
As Ações Teândricas de Cristo
Já que em Jesus há duas naturezas, há também dois modos de agir: o divino e o humano. As operações exclusivamente divinas de Jesus eram as que Ele executava com o Pai e o Espírito Santo desde todo o sempre: criar, conservar, mover as criaturas…
As operações humanas de Jesus nunca eram meramente humanas, porque tinham como sujeito o Filho de Deus; por isto são ditas “divino-humanas” ou teândricas. Distinguem-se dois tipos de operações teândricas:
a) as de sentido largo: a natureza humana realiza o que lhe era próprio (comer, dormir, sofrer…). Eram sempre as atividades de Deus feito homem;
b) as de sentido estrito: a natureza humana cooperava como instrumento da Divindade em ações que escapavam ao alcance do homem, como, por exemplo, os milagres, o perdoar os pecados, o comunicar o Espírito Santo… O poder de Deus passava através dos gestos e das palavras de Jesus para realizar um efeito transcendental.
Em consequência, dizemos que a natureza humana de Jesus se tornou causa eficiente da salvação dos homens. As graças divinas que o Filho de Deus quis comunicar ao gênero humano, Ele quis que fossem dons não somente da natureza divina, mas também da natureza humana de Jesus. Isto se explica pelo fato de que na humanidade de Jesus habitava todo o poder da Divindade; nesse homem havia comunicação de atividades ou a pericorese (interpenetração) de duas operações. A carne de Cristo tornou-se como que um ferro em brasa e, ao agir, agia como uma espada em brasa.
A humanidade de Jesus se prolonga na Igreja e nos sacramentos.