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“A Escritura nos desperta”: O poder transformador da Palavra de Deus

E se existisse um despertador para a alma?

O versículo 8 do Prólogo traz uma afirmação poderosa: “Levantemo-nos então finalmente, pois a Escritura nos desperta dizendo: ‘Já é hora de nos levantarmos do sono’.”

São Bento apresenta a Palavra de Deus como um alarme espiritual. Ela nos acorda. Ela nos tira da letargia. Ela nos levanta.

O sono espiritual

Existe um tipo de sono que não tem nada a ver com o corpo. É o sono da alma, a letargia espiritual, o torpor que nos faz andar em círculos sem sair do lugar.

Você conhece essa sensação? A vida espiritual parece estagnada. As orações se tornam repetitivas e vazias. Os mesmos pecados se repetem. Os mesmos vícios persistem. Parece que não há progresso, não há movimento, não há vida.

É como estar dormindo acordado. O corpo funciona, cumpre suas obrigações, segue a rotina. Mas a alma está adormecida, anestesiada, no piloto automático.

O perigo desse sono é que ele pode parecer confortável. “Está tudo bem”, pensamos. “Não estou fazendo nada de muito errado.” Mas “não fazer nada de muito errado” não é o mesmo que viver. É apenas sobreviver espiritualmente.

A Escritura como despertador

A Palavra de Deus tem o poder de nos acordar desse sono. Ela ilumina cantos escuros que preferíamos não ver. Ela confronta ilusões que preferíamos manter. Ela exige respostas que preferíamos não dar.

Por isso, às vezes, resistimos à leitura da Escritura. Ou lemos rápido, superficialmente, para “cumprir tabela”. Ou evitamos os textos que nos incomodam. Ou interpretamos de forma a não sermos atingidos.

Mas quando deixamos a Palavra de Deus nos alcançar de verdade, ela age. Ela é “viva e eficaz, mais penetrante que uma espada de dois gumes” (Hebreus 4,12). Ela revela “os pensamentos e intenções do coração”.

A tradição monástica e a Palavra

Os monges antigos tinham uma relação impressionante com a Escritura. Muitos decoravam não apenas os 150 Salmos, mas todo o Novo Testamento. A Bíblia era seu ambiente, sua linguagem, seu ar.

Não decoravam por erudição vazia, mas por necessidade vital. A Palavra decorada podia ser meditada a qualquer momento — durante o trabalho, durante as vigílias noturnas, durante as tentações. Era alimento sempre disponível.

São Bento herdou e transmitiu essa tradição. A Regra está encharcada de Escritura — são mais de 150 citações bíblicas diretas, além de inúmeras alusões. O capítulo 48 estabelece tempos específicos para a leitura espiritual. O capítulo 38 determina que haja leitura durante as refeições.

E, sobretudo, a tradição beneditina desenvolveu a lectio divina — a leitura orante da Escritura. Não é leitura de estudo (embora o estudo tenha seu lugar). É leitura de encontro, de escuta, de diálogo com Deus que fala através do texto.

Como deixar-se despertar

A Escritura só desperta quem se deixa despertar. É possível ler a Bíblia e continuar dormindo — se lermos com pressa, com defesas, com superficialidade.

Algumas atitudes ajudam a abrir-se ao poder da Palavra:

Ler devagar. A lectio divina não é corrida. É caminhada lenta, atenta, que para diante de cada palavra significativa.

Ler com o coração. Não apenas entender o texto, mas deixar-se tocar por ele. Perguntar: o que isso diz para minha vida, hoje?

Ler esperando ser transformado. Não para confirmar o que já pensamos, mas para ser questionados, desafiados, convertidos.

Ler com regularidade. Não esporadicamente, quando dá vontade, mas como alimento diário, necessário, insubstituível.

A Escrita faz despertar

“A Escritura nos desperta.” Essa frase de São Bento é um convite e um desafio.

É um convite a fazer da Palavra de Deus companheira diária, fonte de vida, luz para o caminho. É um desafio a deixar-se despertar, a sair da zona de conforto espiritual, a permitir que a Palavra faça seu trabalho em nós.

O sono espiritual é confortável, mas é sono. A Palavra de Deus pode ser incômoda, mas é vida. E a vida, mesmo desconfortável, é sempre melhor que o sono.

Escrito por Um Servo da Tenda

Grupo de Oração Tenda do Senhor

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